LENDA E POESIA, SEU NOME É IRLANDA
Fatima Dannemann *
Cena um: entrada da Trinity College em Dublin. Monte de bicicletas estacionadas e perto dali um mural anunciando coisas diferentes como assembléia feminista, um show de rock e estudantes fazendo bico dando aulas particulares. Cena dois: Dingle Bay, no condado de Kerry. Barcos de pescas aguardam bom tempo enquanto pescadores papeiam malemolentes no pub mais perto. Cena três: um cinema em Killarney exibe o ultimo filme de Spielberg, na porta, charretes em fila fazem às vezes de taxi. Cena quatro: Temple Bar, Dublin. Irlandesas meio clubber cantam e dançam ao som de um vídeo clip. E enquanto tudo isso acontece turistas se dependuram de cabeça para baixo num castelo beijando a pedra que lhe fará voltar a esse país ainda pouco conhecido dos Brasileiros.
Diferente do que muita gente imagina, a Irlanda, ou República da Irlanda é um país de jovens, um país alegre, pulsante, cheio de cultura, literatura e muita magia. Tudo isso é Irlanda, passado, presente, futuro, magia, cultura, lazer, musica, poesia, campos verdes onde pastam ovelhas e cresce a batata, base da alimentação do país, que no século XIX perdeu mais da metade de sua população de fome. Eles tinham a terra, não sabiam cultivar nem preparar a comida. Quem não morreu, foi seduzido por uma vida melhor na América. Mas, a Irlanda tem, também, milênios de história, apesar de só ter conseguido a sua independência nos anos 50. Hoje, como parte da Comunidade Européia, tenta sair do prejuízo melhorando sobretudo as habitações e transportes.
Até muito pouco tempo, as casas da Irlanda eram toscos chalés cobertos de palha quase sem nenhum conforto. "Eu morei toda a minha infância numa casa assim", confidencia uma irlandesa em visita ao Bunratty Folk Park, um parque temático diferente do mundo fake da Disney. Nesse parque, tudo é autêntico, castelo, chalés, fazenda, movéis, foi apenas preservado e é visitado pelas pessoas que descobrem que a Irlanda é mais que discos do U2 ou livros do James Joyce e nada tem a ver com o mundo sombrio de alguns filmes dirigidos por irlandeses.
Um fenômeno natural ajuda o país a ganhar o apelido de Pais do Arco Íris. Quem anda pelas estradas irlandesas, ainda muito estreitas, mas sendo modernizadas com ajuda da Comunidade Européia, pode presenciar seqüências de arco-íris, um após o outro. Muito recortado por baias, pontas, cliffs, o litoral da Irlanda. Em meio a simpáticas fazendas, remanescentes dos celtas, e um dos mais antigos templos cristãos do mundo: o Oratório de Gallarus, construído em pedra imitando um barco emborcado, centro de visitas, estudos e peregrinação.
Oscar Wilde, Bernard Shaw, Bram Stocker, William B. Yeats, Thomas Moore. Alguns desses nomes, os brasileiros já ouviram falar muito. Outros menos. Embora alguns desses nomes reneguem o berço, todos nasceram na Irlanda, pais onde ter cultura é ter prestígio, e nas livrarias, uma grata surpresa: um mesmo livro de autores como James Joyce é encontrado em edições distintas. Com preços para todos os bolsos e alguns com explicações e notas para estudantes. As livrarias são do tamanho de alguns supermercados brasileiros e lá se compra livro por menos de três libras irlandesas (que vale um pouco menos que a libra esterlina).
Livros a mão cheia e muitos deles conta a história do país que vem de muitos milênios. Tudo começou com os proto-celtas. Depois, chegaram os celtas, grandes navegadores, vindos de Portugal e Espanha, principalmente, não só explorando o mundo como tentando escapar do domínio romano. Nessa pré-história irlandesa, os povos viviam em clãs. Eram considerados chefes ou tido como ricos quem tivesse mais terra, mais gado e mais mulher, embora não houvesse distinção tão acentuada entre homens e mulheres: quem chegava primeiro e dominasse a área, era o líder, e se um rei saqueava e tomava a terra de outro, nada demais. Coisas da disputa entre os clãs, muitas delas violentíssimas.
A arte irlandesa nasceu ai. Os bardos (poetas ou cantores) eram tidos em altas contas na sociedade irlandesa (especialmente no período proto-celta) e eram os responsáveis por contar os feitos de seus amos. Com o advento do cristianismo, com a queda do império romano e a invasão dos bárbaros, muita gente foi se refugiar na Irlanda. Tentou-se a conversão daquele povo "pagão", que seguia especialmente o druidismo. Pelas vias normais, não deu. A ética irlandesa era um tanto distinta e começou-se a misturar alhos e bugalhos. Os irlandeses foram alfabetizados e descobriram algo tão interessante quanto formar clãs, criar mosteiros e abadias. E tanto fazia ser homem ou mulher. Tanto São Patrício como Santa Brígida eram chefes de suas comunidades religiosas, algumas das quais se tornaram atuais cidades, e celebravam seus cultos.
De invasor em invasor, a Irlanda sofreu várias dominações e ficou subordinada a coroa inglesa até o século passado (século XX). Hoje, independente, governado por uma presidente, já se moderniza, aceita o divórcio e melhora sua infra-estrutura querendo abrir um novo mercado, o turismo.
Monday, December 04, 2006
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