PÓS-TUDO (E MAIS ALGUMA COISA)
Fatima Dannemann *
Nana Caymmi canta Sábado em Copacabana numa novela de televisão. A Internet anuncia e mostra foto de duas mil pessoas protestando nas mesmas areias da praia que Nana diz no velho samba-canção ter esperado uma semana para conhecer. Em São Paulo, A perícia continua investigando a identidade dos mortos do avião da Tam. Outra cantora, mais ousada, longe da mídia, diz que “Copacabana não me engana, não/ Copacabana é uma ilusão de fim de semana”. Na Bahia, a ressaca e ventos violentos de 30 km/h arrebentam o clube mais chic da cidade. Longe das praias, das músicas, a população do Rio chora as vitimas das eternas balas perdidas e pede que o aparato policial montado para o Pan continue pelo menos por uns tempos.
Esse é o retrato do país pós-pan, pós-tempestade, pós-morte de ACM, o último coronel do norte que se foi desta para uma melhor sem ver duas coisas que ele talvez gostasse de ter visto: Lula vaiado no Maracanã, Waldir Pires demitido do ministério. Mas até isso passou. Botaram a culpa nos pilotos do avião que caiu em Congonhas, implodiram o prédio atingido e, daqui há alguns anos, restarão lembranças. Nana Caymmi segue cantando na novela num cinco estrelas de cenário para uma platéia que mistura personagens do folhetim com personagens da revista Caras e mais alguns artistas. A essa altura, os Jogos Panamericanos ficaram para trás. Lula não foi receber as vaias que sobraram para o prefeito e o governador do Rio. Nem veio enterrar ACM, mandou o vice. Preferiu ir ver a neta dançando em Joinville.
Sim, está nas revistas chiques, vovô Lula vendo a netinha, gorducha e barriguda, dançando no festival de ballet mais importante do país. Na mesma revista que mostra o casamento da filha de Alckmin, que concorreu com o presidente nas ultimas eleições. Uma festa tucana, cheia de empresários, globais, globetes e até uma ilustre ex-detenta: a dona de uma famosa boutique de luxo, trancafiada por duas vezes como sonegadora de imposto. A imagem nesse pós-prisão é melancólica: vê-se uma senhora de meia idade gorda, mal arrumada, mal penteada e com um vestido que até pode ter custado caro, mas não lhe assentou bem. Passou...
Passou mesmo. Ninguém precisa mais de convite para entrar em certos lugares ditos exclusivos. E senhoras dita colunáveis são vistas em camelódromos comprando imitações. Quem vai dizer que não? “Londres”, diz uma esnobe, “nunca mais me vê. Achei aquele aeroporto o fim da picada”. Pobre esnobe que nem sabe que enquanto Nana Caymmi emenda uma música com a Rosa Morena de seu próprio pai (Dorival), uma perua fictícia lá da novela diz que “in mesmo é Reikjavik, na Islândia, civilizadíssima”. Não! Decididamente muita gente tirou o avião de seus planos depois do acidente em Congonhas. “Vou de navio”. Se não der? Fico em casa e vejo o mundo pela janela.
Só que em terra de bala perdida quem fica em janela tem instinto suicida. Melhor fazer que nem Daiane dos Santos, dar uma desculpa e ficar livre do vexame. Já chegam os micos que todos os brasileiros pagam nesse Brasil do pós tudo. Já chegam os baianos verem a Fonte Nova depedrada e descartada caso o Brasil venha a sediar alguma copa do mundo. Já chegam outras incertezas e a cara de pau de colocar a culpa do acidente de avião nos pilotos só porque, a essa altura do campeonato, não há defesa. E vamos continuar vivendo, sim, porque mesmo tendo passado o Pan, o acidente, ACM, e até a novela das oito já esteja além da metade, a vida continua. É a alface que sobe no supermercado tornando a salada que o médico recomenda simplesmente inviável. É o refrigerante que torna seu lanchinho mais caro do que um jantar no japonês mais próximo. São as ondas e os ventos que cedem lugar ao sol. Ainda bem, porque depois de tanto rolo é preciso um refresco.
Thursday, August 09, 2007
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