Nenhuma mulher é toda boa em Duas Caras
Fatima Dannemann
Sou noveleira e assumo. Certo, errado, faz parte da cultura do Brasil e, como brasileira, apenas vou na onda e assisto. Critico, passo mal nas cenas de violência, ameaço nunca mais ver nada mas no outro dia, olha eu lá. Assim tem sido desde que começou Duas Caras, de Agnaldo Silva, uma novela que tinha tudo para ser diferente, legal, com a cara do país mas que está descambando para o clichê, para uma apologia ao conservadorismo e a violencia. Poderia até ser bem humorada, já que o mesmo Agnaldo é autor de algumas pérolas como Fera Ferida, Pedra sobre Pedra e da versão televisiva de Tieta. Poderia ser, inclusive, uma bela lição de vida. O brasileiro podia ter visto, numa novela passada num bairro popular, que é preciso pouco para ser feliz. Mas, deixa prá lá.
Enquanto o autor e a Globo continuam sem noção de nada, achando que estão agradando cem por cento, prefiro falar sobre as mulheres da novela. Justo no verão da “toda boa”, as mulheres em Duas Caras não são flor que se cheire. E eu nem falo de Amara, a mafiosa esposa de Bernardão, interpretada por Mara Manzan, ou Débora, a aprendiz de periguete interpretada por Juliana Knust (que está bem apesar do excesso de maquiagem dar impressão de ter posto massa corrida no rosto). Falo de todas. Ou quase todas.
Até a melhor das personagens femininas tem defeitos pois vive desmaiando, e até pouco tempo atrás tomava uma porção de comprimidos. Em meio a guerra dos mafiosos na Portelinha (sim, mafiosos, e Juvenal Antena é um deles…) Foi que ela acordou para a vida e descobriu a guerreira dentro de si. Isso mesmo. Gioconda, talvez pela força do talento de Marilia Pera, garantiu para si os holofotes da novela. Pior para Marjorie Estiano, uma das piores decepções da nova safra de atriz como uma protagonista que não faz falta na história. Gioconda, acho, deve brilhar ainda mais porque vai trabalhar na ong da Condessa e com certeza deve mostrar alguma garra e muita sensibilidade (pelo menos a da atriz Marilia) como aconteceu no discurso que fez durante as cenas violentas da guerra da Portelinha.
De enfermeira a dançarina de boite, ela vira professora e está prestes a se tornar estudante. Mãe devotada ou esposa dedicada a sustentar uma familia, isso é discutível. O fato é que Alzira (Flavia Alessandra) fez a brasileira comum e normal soltar a cachorra que existe dentro dela e popularizou uma nova modalidade, a pole-dance. Ela e as dançarinas da boite mostram que “massagistas” podem ser esposas, e mães amorosas (embora os filhos da “Outra” só apareçam sozinhos em casa), serem estudiosas (Vesga e Denise farão faculdade graças ao provão do professor Macieira). Elas sabem ser simpáticas e corajosas, quando o sufocador deixa.
E os clichês? Coisa chata, mas aquela coisa da pobre boazinha e da rica ruinzinha existe ainda nas novelas e está sendo protagonizada por Clarissa e Silvia, que aliás serão irmãs. Clarissa é dislexica, luta para estudar (mas sabe beijar na boca e seduzir o bonitinho Duda, pois há coisas que não se aprendem nos livros). Essa é a coitadinha da história. Mas faz parte do jogo. A figura do “coitado” é um ícone nos países cristãos. Pena que até num caso importante como a dislexia, a emissora prefira mostrar o lado do “oh, coitadinha” em vez de mostrar que é possivel dar a volta por cima e viver a vida normalmente.
Silvia, a personagem de Alinne Moraes, com mais botox do que nunca e modelitos maravilhosos, vivendo uma rebelde que pode até não ter causa, mas tem ainda menos caráter. Em contra-partida é cheia da grana e o alvo perfeito para Marconi Ferraço aplicar novo golpe (se conseguir, claro, já que a bandida prefere ser meliante que nem ele).
Branca, Suzana Vieira, não chega a ser o melhor papel da atriz. Mesmo com a rivalidade entre a dona da universidade e Celia Mara (Renata Sorrah), não deve se repetir a rixa Maria do Carmo X Nazaré de Senhora do Destino. Pelo menos não como em Senhora do Destino. Dessa vez, não há vilã e mocinha. Apenas duas mulheres que foram mal casadas, e se relacionaram com o mesmo homem (João Pedro, que morreu no inicio da trama) que no fundo era um cafajeste que enrolava as duas e não tinha coragem de tomar uma decisão.
Eas tchutchucas? Solange e Gislaine são bonitas, jovens, charmosas e querem mais do que viver na favela. Na de procurar um namorado bacanão quase se estrepam pois acabaram na mão de mauricinhos encrenqueiros. São inimigas intimas, claro, porque embora andem juntas e sejam “parceiras” já dá pra perceber que uma inveja a outra (porque não sei). Andreia Bijou: a atriz Débora Nascimento é linda, mas o que poderia ser um conflito interior intenso que até poderia dominar a novela - ser mãe de santo ou rainha de bateria? - com certeza vai morrer no vazio. Falta profundidade na interpretação e no texto. Preferiram apenas explorar a sexualidade e a violência e temas como esse, o sagrado, acabam perdido.
Ah, o sagrado… Vamos respeitar a fé de Gioconda na N.S. da Medalha Milagrosa (eu também acredito nela e garanto: move montanhas). Vamos também respeitar as belas cenas do terreiro de Mãe Bina (Chica Xavier) que infelizmente foram tiradas do ar, sabe-se lá por que (mas eu acredito em forças conservadoras…).
Quem seria a mais “cachorra” da novela? Amara? Débora? Gislaine, que chegou a fazer top less nos primeiros capitulos? Não, em minha opinião é Edivânia (Susana Ribeiro). Tá. Ela se veste com saias compridas, blusas de manga comprida, não usa maquiagem, não depila a sobrancelha, mas e daí? Vai disfarçada ao bar de Jojô e pior: tem a mente povoada dos piores pensamentos principalmente com relação a Ezequiel. Muitas das “maldades” humanas estão nas mentes poluidas das pessoas. E isso Edvania personifica muito bem.
Com Maria Eva, Leticia Spiller interpreta mais uma perua em sua carreira. Dessa vez, uma perua do bem. O que até faz sentido. Há peruas que embora andem com excesso de enfeites por metros quadrados são boas esposas e mães. Maria Eva é assim. Ela gosta de luxo mas não faz cara feia para pegar no batente e ajudar o marido com as despesas da casa.. Mas solta as frangas dançando no queijo em sessões privês. Ah, e adora holofote, confete, coluna social.
Hum, falta Julia… Nem sei o que dizer. Uma personagem que poderia explodir e está bem fraquinha. Hoje alguem comentou comigo no salão de beleza (claro, onde mais há mulheres reunidas com tempo para falar sobre novela): “se fosse Cleo Pires ia dar um banho”… Isso, se fosse. Mas Debora Falabela dá pena, coitadinha… Só ganha da Maria Paula, de Marjorie Estiano. Ah, esta é a protagonista da história? Você tem certeza?
Saturday, January 26, 2008
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