Friday, June 29, 2007

Sonhei que estava na Disneylândia

Fátima Dannemann

Folheio uma revista de turismo e lembro de alguns anos, quando a moda era ir aos Estados Unidos. Mais precisamente, a moda era a Florida, que não chega a ser toda a América, apenas um dos 50 estados norte-americanos. Mais precisamente ainda, a moda era ir aos parques de Orlando. Disney, Universal, Bush Gardens. Subiu o dólar, caíram as torres gêmeas. Bush, Osama Bin Laden e as dificuldades burocráticas se encarregaram do resto e hoje, penso, se tornou complicado conhecer o país do Mickey Mouse (sim porque a Disney é um mundo à parte).
Aqui onde moro, já não se vêem aqueles outdoors imensos que me davam vontade de me juntar à pirralhada que todo ano ia brincar na Splash Mountain ou morrer de medo nos Piratas do Caribe e depois voltar de lá com a mala cheia de quinquilharias – preciosas inutilidades que nos tempos de Collor eram objeto de consumo de dez entre dez candidatos a high society reprovados pela política econômica de Zélia Cardoso de Mello. Levar meninos à sua primeira viagem internacional deixou de ser a mais importante das metas das agências de viagem até porque hoje em dia, outro filão vem se mostrando mais vantajoso, os cruzeiros maritmos.
Mas, Disney é Disney e embora o Universal seja mais divertido, pisar o mesmo solo de Mickey, Minnie, Pato Donald e até de vilões como a Rainha de Copas e Malvina Cruela faz o delírio não só de crianças como até de adultos. E outro dia eu sonhei que estava lá. Uma Disney diferente, diga-se de passagem, pois não era nenhuma das três que eu conheci (sim, além da Florida, estive na Califórnia e em Paris. Advinhe onde?). E eu procurava “cadê Toontown? Cadê o castelo da Princesa?” No meu sonho, não havia a fantasia dos desenhos só a realidade de que hoje, apesar da economia brasileira estar melhor e mais estável, se tornou mais difícil viajar. Vistos, burocracia, o eterno jeito como o brasileiro é visto lá fora.
Pois é. Em Londres, andam barrando até inocentes estudantes brasileiros porque “pode ser um terrorista”. Poxa... Terrorismo no Brasil? Só se for o baixo salário, a falta de segurança, a falta de oportunidades de emprego, o racismo, o preconceito, as doenças infecto-contagiosas, inclusive a AIDS, que avançam de norte a sul do pais, as balas perdidas que atingem inocentes. Não, não somos Osama Bin Laden. Terroristas são os outros. Talvez os fantasmas que impedem a minha Disney dos sonhos de ser algum dos três parques que eu conheci e curti em três diferentes pontos do planeta.
O sonho tem algo de bonito e muito de angustiante: em volta do parque, uma praia deserta onde me dizem para não ir. “Perigoso”. Estacionamentos onde um carro corre o risco de ser perdido. Brinquedos esquisitos. Nem sombra do Mickey embora eu veja o ursinho Puff, “mas não é ele. É parecido”, me dizem, “engana”. E eu não quero enganos, quero certezas. Chego a conclusão que aquela Disney poderia ficar aqui mesmo na Bahia em qualquer boca-quente onde se entra por acaso e se sai por um golpe de sorte: a adrenalina da montanha russa é o medo de cair em mãos erradas. Não há trem fantasma porque quem precisa de trem fantasma se um ônibus é seqüestrado na esquina da sua casa?
E essa é a parte feia. O bonito é ver que o mar, ali, ainda é azul. Que na praia tem coqueiros, tem mato intocado, sem nenhum pivete escondido e pronto para atacar. Ah, e dá para ver peixes nadando. Essa talvez seja a fantasia: peixes nadando tão perto sem medo de serem pescados. O vendendor de água de côco lhe dá o troco sem reclamar, e o sorveteiro garante que o picolé não foi feito com água poluída. Sim, minha Disney podia ser logo ali, num lugar onde o faroeste seria caboclo com direito a guerra urbana que nenhum governante resolve, que ninguém acena com um tratado de paz. Mas era um parque que me fez lembrar que já faz tempo que eu fui a Disneylandia, um parque que me fez lembrar que todo ser humano precisa de um pouco de fantasia.

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